Justiça restaurativa só será eficaz se advogados e promotores mudarem postura
29 de novembro de 2015, 14h40
De 80% a 90% dos que passam por um processo de justiça restaurativa – pela qual o criminoso se encontra com a vítima e busca reparar os danos que causou – não voltam a praticar delitos. Contudo, esse sistema só funcionará de verdade quando advogados e promotores mudarem suas posturas e passarem a ter em mente os impactos de seu trabalho na sociedade. Essa é a opinião do professor norte-americano Howard Zehr, principal referência mundial no assunto.
Em palestra proferida na quarta-feira (25/11) na Faculdade de Direito da USP, em São Paulo, Zehr disse que, num sistema ideal, “advogados se enxergariam como resolvedores ou curadores de conflitos, e não gladiadores”. Dessa forma, eles perceberiam que não têm responsabilidade apenas perante seus clientes, mas também com a outra parte e com toda a sociedade.
O Ministério Público também teria tal visão mais ampla, deixando de atuar como justiceiro e de se gabar pelas condenações que obtém no Judiciário, apontou o professor. Ele explicou que nessa sua utopia, as necessidades das vítimas seriam atendidas desde a notificação do crime, e as penitenciárias seriam o último recurso a ser usado como punição.
Segundo o especialista, infratores só percebem a gravidade de seus atos quando são confrontados com os efeitos deles. Como exemplo, ele citou um caso ocorrido nos EUA de um homem que tinha estuprado uma pré-adolescente. Tal sujeito passou por diversos tratamentos psicológicos e psiquiátricos, mas nenhum surtiu resultado. Até que um dia, anos depois, ele encontrou sua vítima, e ela lhe contou que a violência sexual roubara sua infância. Somente aí o condenado entendeu a dimensão de sua conduta, e nunca mais voltou a praticá-la.
Por causa de situações como essa, Zehr opinou que o modelo restaurativo atende melhor às necessidades que a Justiça deve suprir das vítimas do que o sistema tradicional. Algumas dessas carências são a de garantir a segurança da sociedade e diminuir a probabilidade que o crime volte a acontecer, a de fornecer respostas, o “por quê?” do delito, para que os ofendidos possam criar um significado para o ato, e a de resolver a situação, para que as pessoas tenham condições de reerguer sua autoestima e retomar as atividades cotidianas.
Mas o professor deixou claro que não há um modelo único de justiça restaurativa a ser aplicado em todos os países. De acordo com ele, cada nação deve adaptar os princípios da prática ao seu sistema jurisdicional.