Juiz brasileiro ainda não sabe o que fazer com a Justiça Restaurativa
4 de dezembro de 2015, 9h29
Dezessete anos depois de a Justiça Restaurativa ter sido proposta como elemento de política de educação, justiça e segurança pública,[1] os juízes brasileiros ainda não sabem o que fazer com ela.
Enquanto isso, a Austrália, apesar de ter sido um dos primeiros países a adotar políticas criminais do tipo norte-americano — legislação prevendo prisão obrigatória para certas infrações, “toque de recolher” em lugares e períodos determinados para indivíduos e comunidades, expansão de sistemas prisionais e correcionais com medidas como prisão domiciliar e depósitos de prisioneiros do tipo “Gulag” ou “Carandiru” — na prática as repeliu ao implementar medidas de objetivos específicos:
(1) reduzir a reincidência aumentando a perspectiva de emprego e renda;
(2) diminuir riscos de consumo de álcool e drogas;
(3) promover justiça restaurativa e parcerias para reintegrar infratores nas comunidades.
A experiência australiana se desenvolveu afirmando que o impacto da “Justiça de exclusão” pode ser efetivamente abrandado, fundamentalmente no que diz respeito ao consumo ilegal de drogas, ao qual as autoridades aplicaram abordagem bem diferente da perspectiva militarista empregada nos Estados Unidos, que, concebe uma “ameaça” e simultaneamente a identifica com “fontes de risco” como produtores de drogas estrangeiros, traficantes internacionais em países de democracia fracassada, drogas perigosas cujas propriedades “escravizam”, “monstros” (geralmente negros e latino-americanos) que comercializam e usam o produto — no Brasil, um promotor de Justiça os chama de “faunos”.
Tudo para compor uma agenda com objetivos moralizantes e militaristas. O resultado é exclusão pela via das armas, com destruição ou neutralização dos identificados com fontes de risco que representam o “mal”.
As diferenças entre as duas abordagens são de ênfase.
A Justiça americana prioriza técnicas para enfrentar (e eliminar) riscos específicos associados à composição de substâncias perigosas e a categorias ou tipos de pessoas. Caso da metadona, droga sintética que até meados dos anos 1980 era usada para tratamento de opiácios, transformou-se em problema de contenção de dependentes assim que o sistema de justiça criminal colocou reabilitação em segundo plano em relação à remoção da “escória”.
No caso australiano, por outro lado, conceberam-se estratégias com objetivos de longo prazo, focadas em modos operacionais de minimização dos riscos de saúde, corrupção, propriedade, produtividade, etc., criados pelos contextos e modos de fabricação, fornecimento, consumo e difusão das drogas. A ação do sistema de justiça é mínima, mediatizada por tecnologias e programas com os objetivos específicos acima elencados.
Expedientes que permitiram a Austrália refrear o crescimento de seus índices de encarceramento, ao passo que no Brasil, cujas taxas já foram menores que as australianas, com o recrudescimento das fórmulas políticas e econômicas neoliberais, praticamente quadruplicaram.